Quem nunca pegou o resultado de algum exame médico e foi dar uma espiadinha nos dados apresentados no papel? Alguns exames como o hemograma, por exemplo, vem com os valores de referência e até dá para se ter uma base se o resultado do seu exame está dentro das “normalidades” ou não, mas quando algum número está abaixo ou acima da referência, o bom e velho google é ativado.
Sem nenhum pingo de medo de cancelamento, escrevo com tranquilidade que a maioria (não vamos generalizar) das pessoas, pesquisa ou já pesquisou no google diagnóstico para os sintomas que estavam sentindo, tratamentos para determinadas doenças e já até respondeu uma caixinha de pergunta de algum MedBlogueiro querendo ser diagnosticado.
E olha que o que não falta ultimamente são MedBlogueiros produzindo conteúdos diários sobre a sua área de atuação e usando todas as ferramentas disponíveis nas plataformas para gerar cada vez mais conteúdo e conseguir milhares de milhões de seguidores.
Mas qual o problema disso?
O problema é que cada pessoa tem um organismo, um problema e um contexto diferente das outras milhares de milhões que seguem os MedBlogueiros. Isso quer dizer que determinado tratamento ou remédio “milagroso” não vai servir para todo mundo e isso pode gerar uma quantidade inimaginável de problemas nas pessoas, principalmente, psicológicos.
E isso não é exagero desta humilde escritora, basta dar um google para saber que, mesmo que muitos médicos façam, não é permitido divulgar nomes de medicamentos, promessas de resultados, prescrição de tratamentos à distância sem consulta, entre outras várias pérolas que eles fazem e que se o Conselho de Medicina resolver investigar não vai dar nada bom. Mais para frente eu te explico o porquê.
E tem não médicos que se acham especialistas também
Vai dizer que você nunca viu perfis promovendo dietas “milagrosas” para perder peso em poucos dias ou semanas? Normalmente essas dietas são extremamente restritivas e condenam a ingestão de alimentos essenciais para o funcionamento do organismo. Eu já vi dieta que orientava passar alguns dias tomando apenas líquidos como suco, água e água de coco. Dá para imaginar?
Muitos MedBlogueiros, coach, “especialistas” ou influencers sem nenhuma formação ou estudo na área médica, divulgam nas suas redes sociais “dicas” de “tratamentos milagrosos” sem nenhum conhecimento científico.
Já vi “blogueiro fitness” publicando que determinados alimentos como pão integral e arroz integral são prejudiciais à saúde, também já vi orientações de dietas com restrições absurdas, além de indicação de remédios off label, entre várias outras coisas extremamente preocupantes.
Trago exemplos…
Recentemente a influenciadora digital Mayra Cardi chamou a atenção de muita gente e causou polêmica ao comunicar em suas redes que ficou sete dias em jejum com o objetivo de maior conexão espiritual, porém publicou uma foto mostrando a barriga chapada.
Vale ressaltar que Mayra é uma das “influenciadoras fitness” e, que, inclusive, faz consultorias nutricionais para famosos e outras pessoas que buscam, principalmente, o emagrecimento. Ela é meio que considerada por alguns como uma “especialista” na área e se diz “coach”, tornando o post dela sobre o jejum de sete dias não só absurdo como preocupante, já que ela não tem formação em nenhuma área médica ou de nutrição.
Medicamentos off label
Uma grande pérola de alguns MedBlogueiros são os medicamentos off label. Inclusive, durante a pandemia da Covid-19 a prescrição desses medicamentos ficaram mais escancaradas.
Para quem não sabe, medicamentos off label (“fora do rótulo”) são aqueles prescritos para determinada causa em que ele não é reconhecido nem aprovado pela ANVISA ou outros órgãos regulatórios. (What?) Meio confuso, né? Vamos usar a Covid-19 como exemplo.
Durante a pandemia, alguns médicos começaram a prescrever cloroquina, hidroxicloroquina e ivermectina para a doença, mas esses medicamentos não possuíam nenhuma comprovação, nem estudos de que funcionavam para a doença.
Mas esse é um assunto bastante complicado e o meu objetivo de tocar neste assunto neste texto, é sobre o perigo da indicação e promoção que os MedBlogueiros fazem desses medicamentos em suas redes sociais.
Algo que chamou a minha atenção foram os coaches indicando medicamentos utilizados para hipotiroedismo e para diabetes como emagrecedores. Consegue imaginar o perigo disso?
Quanto vale uma @ ?
Você deve ter achado que eu me perdi no texto ao falar sobre Mayra Cardi e outros perfis de dicas milagrosas, mas isso pode estar interligado e te explico o porquê.
Muitos MedBlogueiros, na ânsia de se promover e ganhar cada vez mais seguidores, fazem parcerias com influenciadores ou orientam seus clientes a divulgarem os procedimentos e tratamentos feitos com esses médicos. Mas esse tipo de promoção ou divulgação, mesmo não sendo feita diretamente pelos médicos, também não são permitidas e não deixam de ser perigosas, principalmente se for comprovado que o profissional compactuou com esse tipo de promoção.
Os médicos não podem prometer resultado garantido e nem promover ou compartilhar publicações de influencers ou pessoas que as fazem e relacionam ao profissional.
Olha só isso aqui
O Artigo 13 da Resolução 1.974/11, do Código de Ética Médica do Conselho Federal de Medicina, afirma que “é vedada a publicação nas mídias sociais de auto retrato (selfie), imagens e/ou áudios que caracterizem sensacionalismo, autopromoção ou concorrência desleal”.
Além disso, de acordo com essa norma, o médico não pode fazer “publicação de imagens do “antes e depois” de procedimentos”, como também “expor a figura de seu paciente como forma de divulgar técnica, método ou resultado de tratamento, ainda que com autorização expressa do mesmo”. O Código de Ética Médica impede ainda a autopromoção e a venda de produtos e apostilas.
Com este informe do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais que é bem curtinho e de fácil leitura, talvez fique ainda mais fácil para você compreender o que pode e o que não pode.
Mas nem tudo é proibido
Não é que você não possa ser um MedBlogueiro, nem deva condenar quem é, já que as redes sociais podem ser grandes aliadas para a publicidade médica.
O próprio Conselho Federal de Medicina não proíbe a prática, desde que seja feita de forma responsável e de acordo com o Código de Ética Médica que afirma: “A publicidade médica deve obedecer exclusivamente a princípios éticos de orientação educativa, não sendo comparável à publicidade de produtos e práticas meramente comerciais”.
Já que chegou até aqui…
Bom, já escrevi bastante. Se você chegou até aqui, talvez tenha desejado me cancelar algumas vezes durante o texto, assim como também pode ter concordado. Mas independente de qual tenha sido a sua reação, quero deixar claro que o objetivo não é condenar, nem polemizar nada, mas sim te manter informado para que seja um excelente médico e utilize o seu dom e o seu aprendizado da melhor forma possível, de acordo com as normas da profissão que você escolheu.