O crescimento vertiginoso das apostas esportivas no Brasil arrasta milhares de jovens do mercado educacional. Uma pesquisa da Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (Abmes), em parceria com o instituto Educa Insights, revelou que 34% dos brasileiros entre 18 e 35 anos adiaram o início da faculdade em 2025 por conta dos gastos com apostas online. O levantamento foi realizado com 11.762 pessoas, das quais 2.317 responderam integralmente o questionário, entre 20 e 24 de março.
O impacto aparece com mais força em regiões como Nordeste (44%) e Sudeste (41%), enquanto Sul e Centro-Oeste ficaram com índices abaixo de 20%. Além disso, jovens das classes D/E investem cerca de R$ 421 por mês em apostas, e nas classes A o valor chega a R$ 1.210, o que revela forte comprometimento da renda familiar.
A perspectiva é ainda mais preocupante: estimam-se 986.779 jovens que podem deixar de ingressar no ensino superior em 2026 apenas por causa desse comportamento financeiro. Uma parte significativa dos entrevistados (52%) aposta regularmente, entre uma e três vezes por semana. Entre eles, 45,3% gastam mais de R$ 350 mensais, um aumento preocupante em relação aos 30,8% registrados em 2024.
Essa tendência leva a cortes em áreas essenciais de qualidade de vida. 24% dos jovens deixaram de investir em saúde e academia, enquanto 28% reduziram saída com amigos ou restaurantes para financiar a prática.
CPI das Bets investiga o fenômeno
Em resposta, o Senado instalou a CPI das Bets com objetivo de investigar os efeitos das apostas online na sociedade. Entre os alvos estão orçamento familiar, saúde mental e a atuação de influenciadores digitais que promovem sites de apostas.
A relatora, senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), chegou a sugerir o indiciamento de influenciadores como Virginia Fonseca, mas o relatório não foi aprovado. Ainda assim, a comissão caminha para convocar novas personalidades digitais, como Gkay e Jojo Todynho.
Relatórios apresentados pela CPI também revelaram o tamanho do setor: o faturamento surpreendeu os parlamentares e, em um caso, alcançou valores comparáveis ao orçamento de dois estados brasileiros.
Além do orçamento, outro fator crítico é o ambiente digital. Estudo do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) revelou que até 24 milhões de brasileiros apostaram em sites de aposta em 2024, e quase metade entrou em endividamento. Relatos apontam que publicidade predatória atinge até crianças em canais do YouTube, muitas vezes sem deixar rastros.
Como destaca Tiago Braga, do IBICT, “o que mais me chocou foi ver publicidade de apostas voltada para crianças, usando canais que apagam o rastro logo depois […], é uma artimanha muito bem pensada”.
Impacto para estudantes de Medicina
Para alunos de Medicina, esse cenário representa risco sério. Um curso que exige dedicação intensa e planejamento orçamentário rigoroso. Portanto, o comprometimento financeiro com apostas pode gerar atraso na formação, abandono de disciplinas e queda no desempenho acadêmico.
Além disso, a pressão emocional que acompanha o vício em apostas, aliada ao já elevado nível de estresse dos cursos de Medicina, acende sinais sobre a saúde mental dos estudantes. Com menos recursos para investir em apoio psicológico, lazer e alimentação adequada, cresce o risco de perder o equilíbrio necessário ao exercício da profissão.
Para lidar com essa realidade, especialistas e entidades sugerem três frentes principais:
- Regulação mais eficiente — A CPI aposta em medidas para restringir publicidade agressiva e limitar atuação de influenciadores.
- Campanhas de conscientização — A Abmes defende iniciativas informativas dirigidas aos jovens sobre os riscos econômicos e psicológicos do jogo online.
- Suporte institucional — Universidades e centros acadêmicos devem oferecer orientação financeira, alertar sobre sinais de vício e promover debates internos.
A expansão das apostas online representa um obstáculo real à entrada e permanência no ensino superior. O fenômeno afeta especialmente estudantes de cursos longos e intensos como Medicina, colocando em risco não apenas trajetórias acadêmicas, mas também a saúde mental dos futuros profissionais da Saúde. Assim, urge combinar regulação, apoio e educação para conter essa onda que ameaça o futuro da educação no Brasil.
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