O tarifaço imposto pelos Estados Unidos, entrará em vigor a partir de 1º de agosto de 2025, com uma tarifa de 50 % sobre todos os produtos importados do Brasil, decisão tomada pelo presidente Donald Trump em retaliação a críticas da diplomacia brasileira e, entre outros fatores, visando transferir custos ao eleitor norte-americano.
Embora o Brasil não exporte medicamentos ao mercado americano, o impacto mais significativo recai sobre insumos, equipamentos e tecnologia médica adquiridos pelos hospitais e pelo sistema de saúde nacional. Apesar de não compactuar diretamente com o setor farmacêutico, que não exporta medicamentos ao hemisfério norte, o Brasil importa uma parte considerável de insumos ativos e componentes de diagnóstico dos EUA.
No cenário de escalada protecionista, uma eventual retaliação poderia elevar preços e pressionar margens de operadoras de saúde, laboratórios e clínicas privadas. O encarecimento das importações não só afeta o custo final de tratamentos como dificulta a previsibilidade orçamentária no segmento.
Incerteza jurídica e patentes em xeque
Ao anunciar o “tarifaço”, a administração brasileira considerou medidas de reciprocidade com efeitos mais abrangentes, incluindo reestruturação da lei de propriedade intelectual. Entre as opções citadas estavam a suspensão ou quebra de patentes de medicamentos norte-americanos, conforme prevê a Lei de Reciprocidade Econômica.
Embora o Ministério da Saúde tenha evitado uma decisão definitiva, mesmo o anúncio dessa linha de ação gerou receios entre investidores internacionais, que vêm reduzindo iniciativas de pesquisa clínica em solo nacional devido à insegurança provocada por possíveis mudanças abruptas nas regras de patentes.
Efeitos sobre inovação e investimento
A Interfarma, associação representante de laboratórios multinacionais, alertou que o ambiente de instabilidade jurídica, que coloca em risco patentes e regulações, afugenta investimentos em P&D e fases avançadas de testes clínicos. A desvalorização da confiança não só afeta tecnologia importada como compromete a agenda de incorporação de inovações, como medicamentos biológicos e diagnósticos avançados.
Mais de 70% dos produtos utilizados nas redes de assistência médica no Brasil vêm do exterior. Assim, num contexto de tarifas elevadas, hospitais e clínicas enfrentam elevação de custos operacionais.
Pressionado por despesas mais altas em peças e componentes de equipamentos médicos, o sistema pode ter que repassar valores aos usuários, sem contar a intensificação da inflação no setor saúde.
Ainda que esse repasse afete mais clínicas privadas, o setor público e os grandes consórcios hospitalares também estimam que, sem um aumento proporcional nos repasses, a execução orçamentária tenderá a apertar novos leitos e filas de exames.
Impactos macroeconômicos
Além do setor de saúde, o PIB brasileiro poderá encolher cerca de 0,16 %, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), à medida que tarifas nos insumos afetem a competitividade industrial e produtiva. Essas pressões, por sua vez, impactam a capacidade do Estado em financiar políticas públicas de saúde.
No âmbito global, o Brasil perde presença diante de parceiros alternativos, como China e Índia, justamente quando poderia reforçar sua posição nas exportações de insumos e equipamentos, deslocados do mercado americano por preços mais altos.
Caminhos diplomáticos e mitigação de riscos
Diante dessa configuração, o governo federal intensificou esforços diplomáticos, propondo a abertura de negociações diretas com os EUA para reverter ou atenuar os efeitos da sobretaxa. Ainda, o Brasil avalia, estrategicamente, ampliar acordos com países asiáticos e europeus, visando assegurar suprimentos alternativos e evitar rupturas nas linhas críticas de insumos médicos.
Paralelamente, se observa avanço de pautas legislativas para flexibilizar patentes farmacêuticas e definir compensações por contingências diante de barreiras econômicas. Essas ações podem gerar um ambiente mais previsível e, com isso, sustentar a continuidade de projetos de inovação no Sistema Único de Saúde (SUS) e nas instituições de pesquisa.
Apesar de não afetar diretamente a exportação de medicamentos, o “tarifaço” de Trump exige do Brasil respostas estratégicas nas áreas de política industrial, regulação de patentes e oferta de equipamentos médicos.
A interdependência estimulada por acordos de comércio anteriores torna inevitável o impacto no custo da saúde e na capacidade de inovação. Ademais, a perspectiva negativa de investimento imposto por incertezas jurídicas pode comprometer o avanço de novas terapias e diagnósticos.
O governo, por seu lado, aposta no diálogo com Washington para reduzir a tensão, na diversificação de fornecedores e em ajustes regulatórios que salvaguardam a jornada de inovação, sem prejudicar o acesso de pacientes nem esvaziar as carteiras das operadoras.
O próximo semestre deverá mostrar se tais articulações serão suficientes para proteger a medicina brasileira dos efeitos colaterais do tarifaço de Trump, que já definiu data para entrar em vigor e pode se espalhar por outros setores além do agro e da indústria.
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