Associação de médicos e CFM divergem sobre certificação de especialistas

Segundo Abramepo, regras do Conselho Federal de Medicina não estão de acordo com a legislação

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Abramepo e CFM

Escrito por:

Karla Thyale Mota

Médicos brasileiros especializados em diversas áreas do conhecimento estão impedidos de trabalhar no Sistema Único de Saúde (SUS), e o motivo é uma política de reserva de mercado mantida há décadas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). A afirmação é da Associação Brasileira de Médicos com Expertise de Pós-graduação (Abramepo), instituição fundada em 2017, com o objetivo de defender médicos pós-graduados de várias regiões do Brasil que se sentem perseguidos no exercício da profissão e não con

No último mês de setembro, a Abramepo divulgou um artigo em que cobra ações do Governo Federal para garantir que médicos especializados possam exercer suas funções. De acordo com o texto assinado pelo presidente da Associação, Eduardo Teixeira, e pelo advogado especializado em Direito Médico Bruno Figueiredo, profissionais pós-graduados em cursos credenciados pelo Ministério da Educação (MEC) não conseguem registrar suas especializações, são descredenciados de clínicas e planos de saúde e impedidos de assumir postos na rede pública. Eles esbarram nas normas do CFM.

As regras do Conselho Federal de Medicina determinam que somente os profissionais formados em residência médica ou que fazem as provas de títulos de entidades vinculadas à Associação Médica Brasileira (AMB) podem obter o Registro de Qualificação de Especialidade (RQE). “Chegamos ao absurdo de ver muitos cursos de pós-graduação chancelados pelo MEC, inclusive de universidades federais, serem desconsiderados pelo CFM (…) Isso acontece apesar de a Lei Federal 3268/57 determinar que todo médico com diploma validado pelo MEC e inscrito no Conselho Regional de Medicina (CRM) pode exercer a medicina em qualquer uma de suas especialidades”, ponderam os autores do artigo.

“Todas as profissões no país têm suas regras de especialização determinadas pelo Ministério da Educação, exceto a Medicina. No caso da Medicina, as competências do MEC e do Ministério da Saúde são usurpadas, já que uma autarquia determina quem pode ou não ser considerado especialista. Essa política impede que o Estado solucione um antigo gargalo da saúde pública, a fila de espera por consultas com especialidades e por cirurgias, prejudicando a população dependente do SUS”, criticam Bruno Figueiredo e Eduardo Teixeira.

O que diz o CFM

Em setembro de 2023, o Conselho Federal de Medicina publicou a Resolução nº 2.336/2023, que dispõe sobre publicidade e propagandas médicas. Conforme a norma, profissionais pós-graduados em cursos lato sensu cadastrados no Conselho Regional devem divulgar a formação seguida de “NÃO ESPECIALISTA”, em caixa alta. “Qualquer médico pode atuar em áreas nas quais se julgue capacitado. Entretanto, se responsabiliza por suas falhas e fica mais exposto a condenações por imperícia caso não demonstre como obteve sua capacitação. O que é vedado a ele é fazer publicidade enganosa, anunciando ser especialista quando não o é”, afirma Julio Braga, coordenador da Comissão de Ensino Médico do CFM.

Julio ressalta que o Conselho Federal não tem controle isolado sobre a formação de especialistas no país. “A AMB (Associação Médica Brasileira), sociedades de especialidades e Comissão Nacional de Residência Médica, sob controle do Governo Federal, também têm papel relevante na formação, na qualidade e na quantidade de especialistas do país. A segurança dos pacientes depende de critérios mínimos e é isso que defendemos”.

Enquanto o impasse sobre o reconhecimento de especialidades médicas persiste, o Brasil sofre a carência de profissionais. Conforme os números, a proporção é de um médico especializado para cada 240 brasileiros. O cruzamento dos dados do DataSUS e do Painel da Educação Médica mostra, por exemplo, que há um pneumologista para cada 43 mil pessoas, enquanto as doenças do aparelho respiratório são responsáveis por 11,4% das mortes no país.

Disputa judicial

A Abramepo busca na justiça garantir o reconhecimento de médicos especializados por meio de cursos lato sensu. A disputa tem produzido decisões ora favoráveis ao CFM, ora à Associação. “Entendo a preocupação do CFM para que exista uma fiscalização maior na pós-graduação. Mas, então, cabe ao Conselho fazer gestão junto ao MEC, e a Abramepo já se ofereceu para participar disso, para criar critérios, normas mais rígidas para as pós-graduações na área médica”, sugere Eduardo Teixeira. 

O presidente da Abramepo reforça que, embora o CFM possa participar do processo, o poder de decisão sobre a regulamentação das pós-graduações é exclusivo do Ministério da Educação. “Isso será feito sempre pelo MEC. O Conselho pode ajudar, sugerir, participar, mas ele não tem poder de decisão sobre a formação e sobre a pós-graduação”.

Do outro lado, o CFM defende que as regras atuais para a obtenção do Registro de Qualificação de Especialidade são suficientes. “Mas algumas podem piorar, flexibilizando a definição de especialista. Cursos lato sensu seguem uma regulamentação que se aplica a todas as áreas da formação após a graduação, mas para a Medicina há outras leis, decretos e normas que visam garantir a capacitação adequada do profissional, que recebe um certificado de aprovação, não um diploma ou título de especialização”, avalia Julio Braga.

Segundo o coordenador da Comissão de Ensino Médico do CFM, cursos de pós-graduação lato sensu não garantem a capacitação recomendada pelo Conselho, Associação Médica Brasileira, Ministérios da Saúde e da Educação, que determinam quem deve constar no Cadastro Nacional de Especialistas, conforme o Decreto 8516/2015.

“Esses cursos lato sensu seguem uma regulamentação que se aplica a todas as áreas da formação após a graduação. Mas para a Medicina há outras leis, decretos e normas que visam garantir a capacitação adequada do profissional, que recebe um certificado de aprovação, não um diploma ou título de especialização”, conclui Julio.

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